Em português não usamos o sexo feminino, nesta frase em que alguém se mostra admirado e revoltado com algo a que está a assistir. Mas esta cena da apreensão de livros, em Braga, terra de gente culturalmente atrasada, por estar muito ligada à hierarquia da igreja cristã (sim, o codex dos livros proibidos pela igreja ainda queimava muitos livros na data em que o quadro de Gustave Courbet, com o título “A origem do mundo” foi pintado e comprado, e continuou a queimar por mais alguns anos, entrando bem no Séc. XX), bem poderia merecer uma pergunta bem portuguesa, onde o sexo masculino já aparece: Mas que caralho se passou ali? E quem foram os caralhos, que não têm outro nome, que se lembraram de dar a ordem de apreensão?
Aparece uma pintura de um nu, com mais de cem anos (e que está exposta ao público no Musée d’Orsay, em Paris), na capa de um livro, e eis que em Braga aquilo é declarado pornográfico. Apenas uns dias antes, em Torres Vedras, uma juíza do ministério público, tinha mandado apreender umas fotos de mulheres nuas, que ridicularizavam o “Magalhães”, fotos que de pornográfico só tinham o gráfico (o trabalho gráfico, pois claro, de impressão).
O que têm em comum estas situações? Na minha análise têm 3 coisas preocupantes:
-1 - alguém que denuncia, e a quem as autoridades dão imediatamente resposta sem averiguar os factos,
2 - autoridades públicas, judiciais e policiais, que se armam em moralistas e praticam uma censura da mais básica que pode existir,
3 – a ausência de uma resposta pronta do poder político, neste caso dos Ministérios para quem estes dedicados funcionários públicos trabalham.
Interessava pois, para além do alarido mediático que se verificou, e que ajudou a que no dia seguinte assistíssemos ao dito por não dito (se não fossem as denúncias públicas, decerto a censura não voltaria atrás), sabermos todos quem foram os denunciantes, quem são, que entidades representam localmente, que interesses têm, onde trabalham (se por exemplo estão ligados à educação). Não basta sabermos que houve denúncias que levaram à actuação censora, quem é que faz denúncias junto da polícia ou de uma magistrada e é logo atendido neste País? No caso de Braga, a polícia, no dito por não dito referiu que tinha sido um grupo de pais, mas o livreiro que foi confiscado, em directo na Antena 1 e RTP 1, disse que era uma mentira, que a denúncia tinha partido de uma só pessoa. Era um grupo de pais, ou era um pai que representa outros numa associação de pais? Ou alguém que representa na Terra o Pai?
E, por outro lado, que averiguações foram feitas pelos ministérios sobre a actuação dos seus funcionários, e a que penas se sujeitam por errarem desta forma e por terem posto em causa a liberdade de expressão e até a cultura. Não podemos estar descansados ao saber que uma juíza vai sair airosamente desta situação, sem perder regalias, sem uma avaliação que a prejudique, na sua carreira cheia de benefícios e de um salário chorudo. Já o caso dos polícias acabará por ser melhor esclarecido, ficando claro que o responsável por ter enviado os agentes proceder à censura se safará airosamente, sacudindo as responsabilidades para o “excesso de zelo” dos guardas, que são sempre carimbados como pessoas sem preparação para avaliar este tipo de questões.
Parecia-me adequado que os ministérios competentes tivessem actuado rapidamente, nomeando relatores para irem fazer uma avaliação da situação e os ministros, num prazo de 24 horas, sossegassem a população. Mas, mais uma vez, convém deixar passar uns dias, para nomear uma comissão, para que depois se faça um relatório que não diz nada de jeito, e entretanto as coisas acabam por cair no esquecimento.
Devíamos ter uma associação nacional de avaliação do funcionamento das instituições, que nestes casos fazia um relatório independente. E detalhado!
A meu ver, para provar que o governo ficou mesmo preocupado com estas duas censuras, e que defende a liberdade (o que ainda nunca provou, fazendo parecer mesmo que defende é o contrário), a Juíza devia ser obrigada a participar no corso de Carnaval em Torres Vedras, mas com as mamas à mostra, num topless bem à moda do Rio de Janeiro, e com um letreiro a dizer: “pornográfico é a publicidade ao Magalhães”. Já os responsáveis pela censura de Braga, deviam ser obrigados a pagar um cartaz enorme, para colar na rua, bem em frente à esquadra, com a reprodução do quadro em causa, e com um letreiro a dizer “pornográfico é o dinheiro que se dá aos bancos”. E, os agentes que foram apreender os livros, teriam que ir ao Museu d’Orsay e comprar posters do quadro, em número suficiente para todas as escolas do distrito de Braga, onde se deslocariam para colocar o poster e explicar aos alunos o princípio do mundo! Mostrar às crianças aquilo que elas vêem mais facilmente em pornografia do que em arte!
Sem comentários:
Enviar um comentário