quinta-feira, dezembro 19, 2013

JOSÉ ANTÓNIO PINTO MANDA OS GOVERNANTES METER A MEDALHA NO...

José António Pinto. Este é o nome que devia encher os noticiários, em vez dos comentadores da treta que todos os dias nos dizem que temos que aguentar a mediocridade e corrupção do sistema político. Roubei do jornal Público umas linhas de um artigo feito pela jornalista Patrícia Carvalho (link para artigo com fotos no Público de 9/12/2013), nas vésperas da ida deste herói dos indignados à Assembleia da República, para compor este meu texto. Neste artigo ficamos a saber que o José António é conhecido por Chalana, e que:

"São muitas as coisas que "Chalana" quer dizer, sobre o percurso que o conduziu, desde que nasceu, há 48 anos, na aldeia de Macieira de Lixa, em Felgueiras, até à medalha atribuída pelo júri do Prémio Direitos Humanos constituído no âmbito da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias da Assembleia da República. A começar pelas suas grandes influências – os dois irmãos mais velhos, que guiaram a sua militância depois de perder o pai com apenas nove anos; o Partido Comunista Português (PCP), em que se filiou muito novo; e o padre Mário de Oliveira, que lhe ensinou, entre outras coisas, que “as pessoas devem ter vida e vida em abundância” e que “a maior capacidade do ser humano é a capacidade de amar, mas também a de se indignar perante as várias formas de injustiça”.

Ele garante que o tem feito – amar e indignar-se – e também se tem esforçado por não ter medo, outro ensinamento do padre Mário. “Se queres mudar a vida dos outros, se queres transformar alguma coisa, não podes ter medo”, diz. E talvez seja isso, concede, que o tenha distinguido dos outros, a ponto de lhe quererem dar uma medalha. O seu nome foi sugerido pelo deputado do PSD Fernando Negrão. O PCP aplaudiu. “O 'Chalana' tem tido um papel exemplar no combate às injustiças”, diz o deputado do PCP Jorge Machado.

"Chalana" não é inocente. Sabe que a colaboração que tem mantido com a comunicação social, e que considera fundamental “porque sem denúncia, não há transformação” (algo que aprendeu com outro Mário, o ex-Presidente da República Mário Soares), lhe dá um “capital social” invejável. “As pessoas odeiam-me, amam-me ou têm medo de mim”, diz. Um capital que foi conquistado pelas muitas denúncias que fez, mas também por ter sido condenado por promover, reiteradamente, o aborto, em 2002, no megaprocesso do aborto, na Maia, e em que foram acusadas 43 pessoas, incluindo 17 mulheres que tinham interrompido a gravidez.

"Chalana" não se dá com posturas politicamente correctas. Os colegas da mesma área, diz, criticam-no abertamente. Porque transporta os utentes no carro pessoal, um velho Peugeot 206. Porque estabelece relações com eles (“os meus colegas têm muito medo do afecto”). Em casa, também não é fácil. Tem duas filhas, de sete e dez anos, e o tempo entre o trabalho, o voluntariado na associação Cor é Vida, no Hospital de S. João, os projectos em que se envolve e o seu lado boémio não lhe deixam muito tempo para a família. “A mãe das minhas filhas às vezes zanga-se.” A única coisa em que não cede, na busca de algum distanciamento, é no telemóvel. Não tem.

Ernesto Santos, recém-eleito presidente da Junta de Freguesia de Campanhã, diz que não conhece os fundamentos da atribuição da medalha a um dos três assistentes sociais que ali trabalham, pelo que não se estende nos comentários. “Uma homenagem destas é sempre mérito de quem a conquista. O José António Pinto trabalha nesta área há muitos anos; esta medalha de certeza que é justamente devida”, diz.

Já Pedro Neves, realizador que esteve presente no DocLisboa, em 2009, com o filme Os Esquecidos, feito em colaboração com "Chalana", emociona-se. “Poucas vezes vi um prémio tão merecido. Ele é um militante 24 horas por dia, sete dias por semana. Acho brutal o seu empenho e o espírito com que o faz, é uma alegria estar com ele. E trabalhar com ele é o sonho de qualquer documentarista com interesse por temáticas sociais porque ele tem uma relação muito boa [com os utentes], abre portas com uma tremenda facilidade”, diz.

Militância é palavra que agrada a "Chalana". Se há coisa que detesta, é que o descrevam como “um escoteiro socialmente descalço”. Ele estuda muito. E volta a estudar sempre que um utente o desilude – vários inventam histórias para o enganar. Pega nos livros do seu amado Pierre Bordieu, sociólogo, e percebe um pouco mais do porquê de ter sido enganado. Quando se sente à beira de desistir, abre a gaveta em que guarda o caderno baptizado de Pequenos e Grandes Troféus, e onde aponta as vitórias do dia-a-dia, e recorda que ainda ontem conseguiu uma saída precária para uma jovem detida poder passar o Natal com a família. “Nessa altura vou ao céu e fico lá em cima. Se sinto orgulho? Claro que sinto!”, diz.

Os seus dias fazem-se destas vitórias, mas o que ele quer mesmo é mudar o sistema. Por isso é que escreveu, no discurso que preparou para amanhã: “Troco esta medalha por outro modelo de desenvolvimento económico”. É isso, sobretudo, que quer dizer aos deputados. Depois, há-de voltar ao trabalho."

E foi assim que no dia seguinte, dia 10 de Dezembro, os deputados e a nação não estavam à espera de um discurso tão bom, nunca tinham recebido uma prenda de Natal deste calibre. Não é só por isto que as medalhas e distinções são dadas quase sempre a gente amiga dos amigos, gente que não incomoda. De certeza que depois de terem ouvido o sermão do José António Pinto, que de forma educada e muito inteligente mandou os corruptos meterem a medalha no cú, se arrependeram desta distinção. Fica aqui o link para uma reportagem video (clicar aqui - cortesia da TVI) e ficam as suas palavras mais marcantes, que consegui apanhar na net. Gostava de ter o discurso completo, mas não o encontrei, por isso aqui vai:

Deixo ficar esta medalha no Parlamento se os senhores deputados me prometerem que, futuramente, as leis aprovadas nesta casa não vão causar mais estragos na vida daqueles que, por terem deixado de dar lucro, são hoje considerados descartáveis.

Quero que os cidadãos do meu país hipotecado realizem os seus sonhos, quero que estes governantes estanquem imediatamente este processo de retrocesso civilizacional, que ilumina palácios, mas ao mesmo tempo deixa pessoas a dormir na rua.

Neste momento em que estou aqui a falar, mais de 120 mil pessoas deixaram já Portugal, cerca de meio milhão de crianças perdeu o abono de família, 140 mil jovens estão desempregados e a maior parte dos idosos recebem uma reforma «miserável».

Quero emprego com direitos para criar riqueza, quero que a dignidade do homem seja mais valorizada do que os mercados, quero que o interesse colectivo e o bem comum tenham mais força do que os interesses de meia dúzia de privilegiados.

Não quero medalhas, quero que os cidadãos deste país protestem livremente e de forma digna dentro desta casa e quando reivindicam os seus direitos por uma vida melhor não sejam expulsos pela polícia destas galerias.


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