«Peço a quem tiver imagens minhas na manifestação de 14 de
Novembro (ou noutra manifestação qualquer) a tirar fotografias que as envie a
fim de constituírem prova neste processo. Obrigada pela vossa
solidariedade.»
Esta semana recebi um telefonema no meu telemóvel de uma
funcionária do DIAP (Departamento de Investigação e Acção Penal) para me
convocar para prestar declarações por ter sido “denunciada” por actos
supostamente praticados por mim na manifestação do dia da greve geral de 14 de
Novembro em São Bento. Quis saber qual a denúncia que recaía sobre a minha
pessoa e a senhora do outro lado da linha referiu, para meu grande espanto, que
eu tinha sido denunciada por cometer “ofensas à integridade física da
PSP”.
A primeira questão a saber é como conseguiram obter o número do
meu telemóvel cujo contrato nem sequer está em meu nome. A segunda questão é
saber como posso ter sido denunciada por um crime que não cometi e por actos que
não pratiquei.
Ontem apresentei-me no DIAP acompanhada de um advogado. Foi-me
lido o auto de denúncia e mostradas imagens captadas na manifestação. As imagens
todas elas de má qualidade e inconclusivas, mostram-me de braço no ar com um
objecto na mão que os “denunciantes” referiram ser pedras. Na verdade o objecto
que tenho na mão é nada mais do que a minha máquina fotográfica que costumo
elevar devido à minha estatura ser baixa para captar imagens, como sempre tenho
feito em todas as manifestações e protestos onde vou. Nas legendas das várias
imagens captadas aparecem aberrações do tipo: “acessório”, assinalando-se com um
círculo, pendurada na mochila, uma máscara dos Anonymous; o meu barrete de lã
colorido é indicado como sendo um capuz (lá vem o estigma dos “perigosos
encapuçados”); até a cor da roupa, preta, aparece referida (!); além disso, na
foto de qualidade duvidosa, onde se vê o meu braço erguido segurando o tal
objecto (máquina fotográfica) pode-se ler na legenda que arremessei à polícia
cerca de 20 pedras ou outros objectos…
Agora pergunto eu: se a PSP me identificou a arremessar 20
pedras e a colocar em causa a sua integridade física, por que não fui eu detida
logo ali? Por que não fui de imediato impedida de mandar mais projécteis que
pudessem atentar contra os agentes? Sim, como é possível ter sido vista a atirar
coisas, contarem uma a uma as cerca de 20 pedras que eu não atirei, mas que
alguém afirma ter-me visto atirar, e deixarem-me à solta para atirar
mais?
Colocada perante estas “provas” e com base nesta absurda
acusação fui constituída arguida com “termo de identidade e residência”, tendo
agora que arranjar forma de me defender.
Como é evidente trata-se de uma perseguição por parte da PSP a
pessoas que estiveram naquela manifestação. Faço notar que nem sequer fui das
pessoas detidas para identificação, estou sim a ser vítima de uma orquestração
por parte da PSP que visa lançar uma perseguição política a pessoas que eles
supõem ser os mais activos na contestação, pessoas que costumam ir às
manifestações, fotografar, passar informação nas redes sociais (o meu perfil de
FaceBook lá continua bloqueado a funcionar a meio gás, sem a possibilidade de
comentar vai para um mês).
Enfim, tal como antes já tinha previsto, no dia 14 de Novembro
começou uma intencional e persecutória caça às bruxas e desde então não param de
acontecer fenómenos sobrenaturais em democracia: identificam-se pessoas em
imagens duvidosas, denunciam-se situações que não aconteceram, subvertem-se
imagens dúbias e de qualidade duvidosa para servirem de prova a acusações
infundadas, usam-se telemóveis pessoais para enviar convocatórias do DIAP e hoje
aconteceu mais uma situação inédita: um telemóvel de um amigo com quem eu estava
tocou; qual o nosso espanto era eu a ligar do meu telemóvel e a chamada apareceu
registada no TM dele como sendo minha, mas o meu telemóvel estava ali mesmo à
mão, bloqueado, sem registo de nenhuma chamada efectuada… isto para além dos
estalidos em certas conversas telefónicas.
Todos os que me conhecem sabem que não sou pessoa para andar a
atirar pedras à polícia, que sempre defendi a estratégia da não violência, da
desobediência civil e da resistência pacífica. Que em todas as manifestações me
movimento de um lado para o outro a captar imagens e que muitas vezes me vejo
obrigada a erguer o braço para fotografar acima da minha estatura. Não há
ninguém que me reconheça ou possa apontar como sendo violenta ou capaz de andar
a arremessar objectos em manifestações, por muito que considere que a violência
com que o sistema nos ataca nos nossos direitos e nas nossas liberdades - e
agora também acometendo contra a integridade física de todos quantos estávamos
naquela praça - possa gerar a revolta e a reacção das pessoas.
A situação não é nova, nem a sinistra estratégia: no dia 5 de
Outubro o Ricardo Castelo Branco foi detido e alvo de idêntico processo de
acusação, também através de imagens dúbias e da mentira de dois denunciantes
(mal) amanhados pela PSP, acusado de atirar garrafas à polícia, mesmo com um
braço engessado e outro braço segurando uma máquina fotográfica. Com coragem e
determinação levou o caso às últimas consequências até por fim ser ilibado.
Por tudo isto decidi tornar pública esta absurda acusação e peço
a todas e a todos vós que divulguem este caso. Pela minha parte vou fazê-lo por
todos os meios ao meu dispor, incluindo a comunicação social. Hoje sou eu a
visada mas qualquer um pode vir a ser o próximo a ser alvo de falsas denúncias e
acusações. O que sempre mais me empolgou e indignou são as situações de
repressão, perseguição e de injustiça. A verdade é mais forte e há de vencer
todas as calúnias.
Peço a quem tiver imagens minhas na manifestação de 14 de
Novembro (ou noutra manifestação qualquer) a tirar fotografias que as envie a
fim de constituírem prova neste processo. Obrigada pela vossa solidariedade.
Paula Montez
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